Aviso: Necessita-se de vida
Me olhei no espelho, vi minha pele exposta e à mostra, em simplesmente
um piscar de olhos observei-me novamente, o que antes era carne transformou-se
em palavras, frases, parágrafos, e enfim textos.
Refletido pelo vidro, estava minhas brincadeiras de infância,
imaginações no meio da noite, sonhos vividos ou apenas envoltos em neblina na memória,
acontecimentos, pensamentos, ensinamentos e até suposições.
Coloquei as roupas, escolhidas a dedo para mostrar meu eu ao
mundo mesmo sem dizer nada, cobri os trechos da minha vida e saí na rua, entrei
no mundo das estatísticas e números, enquanto eu era apenas uma letra, sentia
ser uma incógnita, embora trocassem-me por múltiplos ou primos, dividam, diminuíam
ou elevavam ao quadrado.
Durante uma caminhada, cores cinzentas apresentavam suas majestosas
formas, retângulos, quadrados, pontiagudos.
Ao passar por uma caixa de som, as notas transbordavam ao
redor colorindo o caminho, pouco se importando com o que tinham a expressar,
outros ouviam sem ouvir e seguiam em frente.
Um parque vazio encontrava-se no centro da cidade, nos
grandes prédios, plantas artificiais estampavam as entradas e escritórios.
Casais brigam nas suas casas, nenhum dos dois era como as pessoas que viam pela
tela do celular e quando os erros apareciam, o casamento acabava.
No jornal tocando no bar, uma bala perdida matava mais um, o
número 167 do ano, mais uma história apagada, um livro encerrado com as páginas
em branco, o contador olha e o guarda no armário junto com os outros, aquelas
folhas não haviam feito grande coisa na vida.
Amanhã, uma nova edição de tantas outras mais, uma nova
tragédia de tantas outras mais.
Do meu lado, um senhorzinho negro com o apoio da bengala,
cantarolava baixinho o ‘Não existe amor em SP” do cantor Criolo, e encolhido
com a mão esquerda apoiada nas costas arqueadas.
-Os bares estão cheios, de almas tão vazias...
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